sexta-feira, 1 de outubro de 2010

Talvez

O banco estava frio e a chuva caía copiosamente. Mas o rapaz, contrariamente ao esperado, não mexeu um musculo; ou melhor, mexia vários, mas nenhum quis que ele se levantasse e se abrigasse do temporal. As pernas tremiam-lhe, a cabeça olhava em volta constantemente, como quem espera ver algo de diferente ou alguém a chegar. Suspirava, e serão na cara dele lágrimas ou é a água celestial que o faz parecer?
Estava naquele banco faziam horas. Chegara alegre, nervoso, sim, mas aquele nervoso que podemos adivinhar ser de algo bom. Aquele nervoso que até levou o rapaz a, quando quis falar a alguém que conhecia, fazer uma careta esquisita e não ser capaz de articular uma frase coerente. A felicidade que trouxera foi desaparecendo à mesma medida que o Sol tímido se foi escondendo atrás das nuvens, que se foram carregando e acizentando juntamente com o semblante do jovem.
A chuva carregava, a noite chegava e o rapaz não se decidia a ir embora; já não olhava em volta, percebe-se que a esperança já não é o que o mantém ali. Não se percebe, na verdade, o que será; as lágrimas já nem pela chuva são disfarçadas e as pernas, fracas, já não tremem. O olhar está fixo num ponto inexistente, cheio de um vazio que nos deixa adivinhar pensamentos bem profundos ou um adormecimento sem sonhos, nem pesadelos.
A dada altura, o rapaz sorri. Não é um sorriso feliz, é um sorriso irónico, frio, escuro. Talvez percebera, com mágoa, que há coisas que parecem tirar o sentido à vida; há coisas que fazem com que frio e chuva e noite cerrada deixem de ser um problema, uma preocupação. Talvez o rapaz tenha chegado à conclusão que não valia e pena ir para casa porque o seu lar havia ruído, despedaçado sob a força cruel da indiferença. Talvez o banco fosse o que mais o ligasse à luz ao fundo de um túnel que de repente ficou a negro.
Talvez. Com isto, não se sabe para onde terá ido. Em boa verdade, não se sabe sequer se terá ido. Ficar, também não ficou.
No dia a seguir o banco foi ocupado por um velhote que passeava o cão, mais tarde por uma mãe com o seu bebé, e ainda por um casal de namorados. O dia foi de Sol e calor e Primavera. A chuva limpara as lágrimas e nunca ninguém soube dos desamores que o banco acolhera. Falasse o banco e talvez soubéssemos do destino que pobre rapaz que o perdera por completo.
Dizem que a pedra não tem vida, não tem cor, não tem cheiro, não tem calor, não tem sangue, coração. Mas tem muito que contar; e dura para sempre.

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