O poeta não é pobre
O poeta não é um fingidor
O poeta bebe magia
P'ra amor fazer noite e dia
O poeta é um Beija-flor!
domingo, 31 de outubro de 2010
Por onde?
Um beijo
Um abraço
Um colo,
Um sorriso quente.
Todos os têm e os querem
E eu não sou diferente.
Mas o caminho à minha frente
Tem sempre, sempre, dois lados.
E se num te tenho e sou teu
O outro livre é também desejo meu
Sonhos perdidos, abraços nunca dados.
Um abraço
Um colo,
Um sorriso quente.
Todos os têm e os querem
E eu não sou diferente.
Mas o caminho à minha frente
Tem sempre, sempre, dois lados.
E se num te tenho e sou teu
O outro livre é também desejo meu
Sonhos perdidos, abraços nunca dados.
sábado, 30 de outubro de 2010
Carta de quem não foi, para quem poderá ainda ser
Ao cabo de oitenta anos de vida, pensa-se mais no passado do que no futuro, não por não haver amanhã, só mesmo por não se poder saber com certeza o que ele guarda. Sonha-se muito com esse amanhã, mas pensar, pensa-se no ontem. Quem me vê de fora e pudesse, como se faz aos livros, folhear as primaveras da minha vida, diria facilmente que fui uma mulher bem sucedida. Realizada. Estudos, carreira profissional sempre em crescendo e muito prestigiante e bem-remunerada. Administradora de umas das mais cotadas empresas de telecomunicações do país parece algo realmente digno de orgulho. Agora que olho para trás, só vejo quatro paredes e uma secretária e um computador, que dizem ser uma janela mas para mim assemelha-se agora mais a um muro de betão bem alto e cinzento. É só. Nunca pude, nem quis, casar. Fui sempre demasiado dedicada ao meu trabalho e ele sempre me roubou muito tempo, ora aí está uma coisa que o dinheiro não pode comprar. Talvez devido ao meu trabalho deixe, depois de morrer, o meu nome gravado numa pedra fria qualquer. Mas deste mundo mais não deixarei mais que aquilo que levo dele, pouco ou nada. Sinto-me assolada por uma tristeza de morte, e escrevo esta carta para deixar prova e finalmente dizer aquilo que nunca tive coragem de dizer em voz alta. Cá vai: sempre sonhei ser uma astronauta. Mais do que um sonho de criança, sempre quis partir em missões através dessas mil estrelas que pintam o céu que só agora aprendi a apreciar cá de baixo. Parecem pirilampos e também as estrelas dançam e dão-me abraços enquanto ao longo da minha vida de tijolo me tentaram ensinar a bailar com elas. Muitas vezes sonhei comigo no espaço, onde não há tempo nem gravidade e a cortina entre o real e a fantasia é mais ténue que em qualquer outro lado. Pensava eu, pensando como os outros, que eram esses sonhos para artistas preguiçosos que nada querem fazer da vida. Pois agora entendo que quem leva a sua existência sem saber que sapatos vai calçar amanhã não faz mesmo nada da vida. Vive. Eu não vivi, eu limitei-me a a existir, a ser, a corresponder as necessidades físicas de um corpo que tanto aprisiona uma mente que quer voar. Não sei quantos mais anos tenho de vida, sei que pouco posso fazer deles, e sinto que não serão tantos quanto isso. Penso em duas possibilidades de vida depois de adormecer para não mais acordar: ou irei para um local sem corpo e aí a minha mente vai dançar luzidia que nem os meus pirilampos mágicos ou, então, reencarnarei e terei outra oportunidade de existência. Aconteça este segundo cenário e juro a Deus que me está quase a receber que serei astronauta, descobrirei astros nunca dantes contemplados. Ah, verei a outra face da Lua. E rir-me-ei de quem como eu viveu dentro de quatro paredes num mundo que tem quatro cantos e quatro elementos. Ontem tive um sonho bastante peculiar: dormia no meu quarto mas não havia tecto nem telhado nem nada, só o céu. Quem ler esta carta e puder ainda viver, por favor, tira os tectos da tua casa. O céu não tem limites, e o infinito é um papel imenso em branco. Pega nos lápis de cor, e desenha. Pirilampos.
Barquinho de papel
Construí o meu barquinho de papel
Com toda a inocência e simpleza
Que uma criança põe
Quando constrói um barquinho de papel.
Desenhei nele sorrisos
Beijos no seu lado esquerdo
Desenhei castelos e uma princesa
Ia na proa, capitã.
Também lhe desenhei um amor
Pela chuva e trovoada
Que as pessoas odeiam.
Eu gostava e gosto dela
E a princesa da proa também.
Por causa desse amor
Começou a chover muito
E eu estava na rua.
A água apoderou-se da estrada
E fez dela um rio
Engraçado como a Natureza
Conquista e ganha ao Homem
Coisas que, afinal, são suas.
Lancei o meu barquinho de papel
Pintado a amor de criança
Pela corrente do rio da estrada
E vi-o afastar-se lentamente.
Lá ia a princesa, e os beijos
E os castelos e os amores.
Um dia espero que o barquinho volte.
Com toda a inocência e simpleza
Que uma criança põe
Quando constrói um barquinho de papel.
Desenhei nele sorrisos
Beijos no seu lado esquerdo
Desenhei castelos e uma princesa
Ia na proa, capitã.
Também lhe desenhei um amor
Pela chuva e trovoada
Que as pessoas odeiam.
Eu gostava e gosto dela
E a princesa da proa também.
Por causa desse amor
Começou a chover muito
E eu estava na rua.
A água apoderou-se da estrada
E fez dela um rio
Engraçado como a Natureza
Conquista e ganha ao Homem
Coisas que, afinal, são suas.
Lancei o meu barquinho de papel
Pintado a amor de criança
Pela corrente do rio da estrada
E vi-o afastar-se lentamente.
Lá ia a princesa, e os beijos
E os castelos e os amores.
Um dia espero que o barquinho volte.
quinta-feira, 28 de outubro de 2010
Passatempo de escrita
Era ainda noite mas o dia rompia, já cheirava a Sol na rua apesar de ainda reinar a Lua. Afonso estremeceu mal o primeiro raio lhe beijou o rosto. Acordou. Doíam-lhe as costas, afinal de contas um banco de jardim não é exactamente o mesmo que uma cama de dossel. Esfregou os olhos, à procura da realidade. Teria sido tudo um sonho?
Proponho um desafio aos leitores do blog. Pegando neste pequeno parágrafo, dêem-lhe um início, imaginem e escrevam o sonho que a personagem Afonso teve, começando, sugiro eu, por dizer como foi ele ali parar. Não estou à procura de um conto genialmente bem escrito, apenas de uma boa dose de originalidade. Não há qualquer restrição a nível de número de linhas ou palavras, deixem a imaginação escorrer. No dia 15 de Novembro publicarei aquele ou aqueles (dependendo do número de textos) que considerar mais originais!
Os textos deverão ser enviados para o meu mail (mendez1_15@hotmail.com) ou através de um comentário, como preferirem. Podem ou não ser assinados! Fico à espera...
Proponho um desafio aos leitores do blog. Pegando neste pequeno parágrafo, dêem-lhe um início, imaginem e escrevam o sonho que a personagem Afonso teve, começando, sugiro eu, por dizer como foi ele ali parar. Não estou à procura de um conto genialmente bem escrito, apenas de uma boa dose de originalidade. Não há qualquer restrição a nível de número de linhas ou palavras, deixem a imaginação escorrer. No dia 15 de Novembro publicarei aquele ou aqueles (dependendo do número de textos) que considerar mais originais!
Os textos deverão ser enviados para o meu mail (mendez1_15@hotmail.com) ou através de um comentário, como preferirem. Podem ou não ser assinados! Fico à espera...
Poesia a dois
Em termos de oração
Muito rezar vale uma vez
Cantar por si vale por duas
Amar, penso, vale por três.
E quando há amor há coração
Há menos cabeça e para quê?
Se a vida nada mais é que emoção
E amor, amor... Só se sente uma vez.
E será quando no fundo de um olhar
A areia e o vento pararem de correr
Razão não é nada, se posso amar
De números e químicas não quero saber.
E como o mar se junta à praia
E cada um, em uníssono, se interpreta,
Só um amor neste momento ensaia:
O amor de ser poeta!
Muito rezar vale uma vez
Cantar por si vale por duas
Amar, penso, vale por três.
E quando há amor há coração
Há menos cabeça e para quê?
Se a vida nada mais é que emoção
E amor, amor... Só se sente uma vez.
E será quando no fundo de um olhar
A areia e o vento pararem de correr
Razão não é nada, se posso amar
De números e químicas não quero saber.
E como o mar se junta à praia
E cada um, em uníssono, se interpreta,
Só um amor neste momento ensaia:
O amor de ser poeta!
Poema escrito juntamente com o André Santos,
do blog http://conquistaoteumundo.blogspot.com/
quarta-feira, 27 de outubro de 2010
A meio caminho
Acordei deitado na pedra da calçada, nu, frio, sozinho. Conforto e quente e cama pareciam conceitos de outra vida, contudo, mesmo que não vivo, também não estava morto. Estava a meio caminho. Nem terra nem céu.. Olhei para cima, para o pano de estrelas. E gritei, não com voz, que não a tinha, mas com a alma, que essa nunca ma tirarão. Quem és tu? Vamos pega-me, sou teu filho. Se não existes ficarei aqui para sempre. Mas eu sei que existes. Disseram-me que para te ver tinha que vir ter contigo. Aqui estou. Talvez esteja no lado errado da rua, mas aqui estou. Sabes, sempre pensei que mais tarde ou mais cedo chegaria a casa, deitava-me e ficava à espera que acontecesse, e nem quando sonhava cheguei. Agora sei que tinha que ir ter contigo a meio caminho. Estou- te agradecido pelo que tive lá atrás, mas agora quero algo para sempre e ficarei bem. Por favor, se me ouves, dá-me colo...
segunda-feira, 25 de outubro de 2010
1+1=2 ?
O mundo todo e coração é feito Do simples amor! Paixão e fogo e nunca
De verdades absolutas e certezas De outro penso vir. Cruas simplezas,
Não há sentimento nem emoção, Bom é complicar e só sentir, e assim
Morram bruxas, dragões, princesas Morrerei pois eu poeta sem almas presas.
E quem pensa em duas simples quadras
Resultado de conta sem segredo nenhum
Conte de novo, talvez hajam surpresas
É que um mais um... ah!, é igual a um.
Junta-se a sede à vontade de escrever
Escrevo muito e muito escreverei
Os dedos trabalham mesmo que eu mudo
E muito não me mata a sede, quero tudo
Sei que é impossível, porém tentarei.
Os dedos trabalham mesmo que eu mudo
E muito não me mata a sede, quero tudo
Sei que é impossível, porém tentarei.
Boas festas
O grande problema da Páscoa é que se jejua durante 40 dias ansiando pelo último, no qual se podem comer mundos e fundos.
Já o do Carnaval, é que no meio de brincadeiras e tropelias se chega rapidamente à conclusão que as pessoas não colocam máscaras, limitam-se a tirar as que usam o ano todo.
No que toca à passagem de ano, o problema reside em se desejarem mil e uma coisas em dez segundos e não se perseguir esses desejos nos 364 dias que se seguem.
No dia do pai e da mãe, tomamos atenção às pessoas que menos deveriam ter que esperar por um único dia para a receberem.
O problema dos dias de aniversário é que voltamos a ser algo que nunca devíamos colocar definitivamente de lado nos outros dias do ano.
O dia das mentiras, esse, só nos dá uma boa desculpa para fazermos aquilo que já fazemos nos restantes.
E por último, o grande problema do Natal é ser quando os homens querem e não quando as crianças desejam.
Já o do Carnaval, é que no meio de brincadeiras e tropelias se chega rapidamente à conclusão que as pessoas não colocam máscaras, limitam-se a tirar as que usam o ano todo.
No que toca à passagem de ano, o problema reside em se desejarem mil e uma coisas em dez segundos e não se perseguir esses desejos nos 364 dias que se seguem.
No dia do pai e da mãe, tomamos atenção às pessoas que menos deveriam ter que esperar por um único dia para a receberem.
O problema dos dias de aniversário é que voltamos a ser algo que nunca devíamos colocar definitivamente de lado nos outros dias do ano.
O dia das mentiras, esse, só nos dá uma boa desculpa para fazermos aquilo que já fazemos nos restantes.
E por último, o grande problema do Natal é ser quando os homens querem e não quando as crianças desejam.
domingo, 24 de outubro de 2010
Pote de ouro
O dia era de miúda chuva e Sol raiante
Sabe lá Deus se há-de rir ou chorar.
Se desenhou então no céu, brilhante
Arco-íris de sete cores, fascinante
De perder em vista onde ia acabar.
Da janela pouco me senti satisfeito
Saí, lembrado de histórias de princesas.
Pois li, não sei se em livro se no peito
Que quem de arco-íris acha fim, tem direito
A um pote de ouros e jóias e riquezas!
Errante andei meses e semanas e dias
Já não os podia contar, por não ter dedos.
Passei por vales, rios, mares de magias!
Animais como David, montanhas que nem Golias
Enfrentei dragões, bruxas, espelhos, medos.
Por fim, já após o horizonte conhecido
Encontrei o termo ao arco já amigo.
Procurei por arca ou pote, estaria escondido?
Achei-o enfim, não ali, que nunca fora perdido,
Pois ao longo da viagem... já vinha comigo.
Sabe lá Deus se há-de rir ou chorar.
Se desenhou então no céu, brilhante
Arco-íris de sete cores, fascinante
De perder em vista onde ia acabar.
Da janela pouco me senti satisfeito
Saí, lembrado de histórias de princesas.
Pois li, não sei se em livro se no peito
Que quem de arco-íris acha fim, tem direito
A um pote de ouros e jóias e riquezas!
Errante andei meses e semanas e dias
Já não os podia contar, por não ter dedos.
Passei por vales, rios, mares de magias!
Animais como David, montanhas que nem Golias
Enfrentei dragões, bruxas, espelhos, medos.
Por fim, já após o horizonte conhecido
Encontrei o termo ao arco já amigo.
Procurei por arca ou pote, estaria escondido?
Achei-o enfim, não ali, que nunca fora perdido,
Pois ao longo da viagem... já vinha comigo.
sexta-feira, 22 de outubro de 2010
Um poema
Um sentimento fechado
Mais vontade de o abrir.
Poema nasce trancado
O lápis o faz sair
Espelho de alma, um dilema
Mais rima para coração ouvir
Assim se faz um poema.
Mais vontade de o abrir.
Poema nasce trancado
O lápis o faz sair
Espelho de alma, um dilema
Mais rima para coração ouvir
Assim se faz um poema.
quinta-feira, 21 de outubro de 2010
Eu
Não sei quem sou. Quem me vê na rua e me conhece só a cara, tem dificuldade em chamar-me poeta, ou escritor, ou lá o que se chama a quem escreve o que eu escrevo. Sou o Diogo, esse sou eu, mas serei eu inteiro? Aqui, nestes campos, assino Diogo Pintas. Não é o meu verdadeiro nome, mas gosto de acreditar que é o meu verdadeiro eu. Mas será? Sou só Diogo, serei Diogo Pintas, serei os dois? E sendo os dois, são misturados, são separados, complementam-se ou são antagónicos? Não sei quem sou. Parecemos dois diferentes, mas os dedos que aqui são extensão de alma são os mesmos que, lá fora, apertam mãos. Aqui comprimento, lá fora cumprimento. Acho que me sinto melhor aqui; porém, também lá fora sou feliz! A verdade é que aqui posso ser quem quero. Muito do que escrevo é pura criação artística. Exemplo? Nunca tive um amor platónico, e talvez o poema anterior o possa fazer adivinhar. Aqui, extendo-me, expando-me, estico-me, anseio e tento uma plenitude que nunca será plena mas será sempre o máximo que posso. Lá fora sou um, mas será o que as pessoas chamarão do eu real. Não quero ser esse, mas também sei que não sou estes. Não sei quem sou.
quarta-feira, 20 de outubro de 2010
Do amor platónico
Não me digas que me amas!
Di-lo com os lábios da alma
E com a boca do teu olhar.
Não te quero ouvir falar...
Só te quero ouvir sentir.
Sem te ver ver-te sorrir
Saber que és minha
Ao dar-te a mão.
Não, não quero dedos;
Quero que me dês, sem medos
As mãos... do teu coração.
Pensa em mim, não me conheças
Só quero que me aqueças
Nos tempos de grande frio
Não com beijos de carne dados
Mas aqueles só recordados
De um tempo que não existiu.
Di-lo com os lábios da alma
E com a boca do teu olhar.
Não te quero ouvir falar...
Só te quero ouvir sentir.
Sem te ver ver-te sorrir
Saber que és minha
Ao dar-te a mão.
Não, não quero dedos;
Quero que me dês, sem medos
As mãos... do teu coração.
Pensa em mim, não me conheças
Só quero que me aqueças
Nos tempos de grande frio
Não com beijos de carne dados
Mas aqueles só recordados
De um tempo que não existiu.
terça-feira, 19 de outubro de 2010
Choro a dois
Apetece-me andar à chuva
Uma poesia nada aparente
Estar frio mas sentir quente
Como se bebera néctar de uva.
Chorar sozinho, a andar
E ter um disfarce da natureza
Nada saber e ter certeza
Nem do que sou, nem onde vou chegar.
Cada gota ser um beijo
Directo ao meu coração
Perder dele a razão
Sentir, é o que desejo.
Uma poesia nada aparente
Estar frio mas sentir quente
Como se bebera néctar de uva.
Chorar sozinho, a andar
E ter um disfarce da natureza
Nada saber e ter certeza
Nem do que sou, nem onde vou chegar.
Cada gota ser um beijo
Directo ao meu coração
Perder dele a razão
Sentir, é o que desejo.
A minha prenda
O meu trenó é a poesia
As renas são o teu sorriso
Não voo, não por falta de magia
Mas, por ter a tua companhia
Aqui, tenho tudo o que é preciso.
As renas são o teu sorriso
Não voo, não por falta de magia
Mas, por ter a tua companhia
Aqui, tenho tudo o que é preciso.
segunda-feira, 18 de outubro de 2010
Cores
Nos meus anos ofereceram-me muitas coisas. A mamã ofereceu-me duas camisolas e umas calças, muito giras; o papá ofereceu-me um jogo novo para a consola, que eu já lhe andava a pedir à muito tempo!; os avós, para além de um maravilhoso bolo de aniversário, deram-me umas meias e um cachecol para o Inverno; os tios deram-me dinheiro e a minha irmã mais velha um CD de música. Foram todos presentes muito bons... menos o do Padrinho. Deu-me, às escondidas (com certeza com vergonha da prenda), um lápis de carvão, que nem se pode dizer que fosse um lápis muito bonito. Quando mo deu, disse que era um lápis especial... eu posso ainda ser pequenino, mas não me deixo
enganar assim; mas não me importei, afinal tinha tido muitos presentes, muito bons.
Chovera a noite toda; de manhã, quando acordei, a terra estava molhada, as nuvens continuavam cinzentas e um Sol tímido ia espreitando por entre elas, mas mal ganhava um pouco mais de coragem, era logo tapado. Ao pé de minha casa havia um sítio que eu gostava imenso; era uma espécie de colina, não muito alta mas que dava uma imagem linda do céu, totalmente livre de prédios e antenas e telhados e essas coisas dos homens que só estragam paisagens. Tinha lá também um pequeno parque infantil com baloiços, onde muitas vezes me sentava a olhar aquela bonita imagem. Pedi à mãe para ir para lá e, como era mesmo muito perto, a mãe deixou, como aliás costuma deixar sempre. Da janela da cozinha até podia ir-me vendo, por isso, nunca houve problema. Fui para lá então, sentar-me no meu baloiço; quando me sentei, senti uma coisa bicuda no bolso e fui ver o que seria... era o lápis do Padrinho! Não me lembrava de o ter posto no bolso, mas na verdade não me lembrava do que realmente lhe tinha feito. Fiquei com ele na mão, também era má-educação deitá-lo fora, apesar de ter mil e quinhentos lápis de carvão. Olhei para o meu céu. Nuvens imensas pairavam no ar, tão grandes e pesadas que me admirei como não caíam ao chão e se mantinham lá em cima, a voar. Eu sou bem mais pequenino e nunca consegui... Cada uma dessas enormes nuvens era de um cinzento muito escuro, curiosamente da cor do meu lápis de carvão. Quando olhei para ele para fazer esta comparação, não quis acreditar nos meus olhos! O lápis tinha-se transformado num lápis de cera branco.
Sem saber se devia ficar assustado ou admirado ou contente, fiquem a olhar para ele. Virei-o, aproximei-o dos olhos, afastei-o, bati com ele nos ferros do baloiço, até o trinquei; era real e era mesmo branco, um branco de uma pureza que eu nunca tinha visto. Sem saber bem o que esperar ao fazer aquilo, comecei a agitá-lo no ar. E atrás dele vinha um feixe de luz! Parecia uma varinha mágica. Baixei-o o tornei a olhar para ele atentamente. Na minha cabeça fervilhavam emoções e sei lá mais o quê, não sabia mesmo o que se estaria ali a passar. Quando olhei para o céu novamente, vi algo muito estranho: uma enorme nuvem, que há pouco tinha parado ali mesmo em frente, suspensa, tinha uns riscos brancos esquisitos, sem ordem. Olhei para o lápis, e de novo para a nuvem. Experimentei de novo uns movimentos no ar, e confirmou-se: eu podia pintar a nuvem com o meu lápis. Não quis saber de mais nada, nem se seria um sonho, nada. Pus-me a pintar toda a nuvem, que num instante deixou de ser cinzenta e feia para passar a ser um imenso quadro do branco mais branco que já existiu. Sentei-me no baloiço e olhei para o meu lápis mágico e para a brancura da nuvem. Fixei de novo o lápis e, nova surpresa: tinha-se tornado verde.
Com o meu lápis mágico pintei então planícies e colinas, tudo no meu imenso papel branco, a minha nuvem. Era uma relva fresca, muito bonita. Depois o meu lápis ficou azul, e dentro da nuvem pintei o céu, limpo, um céu de Verão. Ainda com o azul do meu lápis pintei um enorme rio que nascia lá ao longe no horizonte vinha dar a um lago muito grande, onde depois, com o rosa que veio a seguir, pintei flores na sua margem e borboletas enormes que mais pareciam fadas! Quanto mais depressa eu desenhava mais rapidamente o meu lápis mudava de cor. Logo a seguir ao rosa veio o castanho, e eu pintei barquinhos no meu lago. Logo depois ficou amarelo! E eu desenhei um enorme e quente Sol, cuja luz saiu do meu quadro e iluminou tudo o que era possível ao meu olhar alcançar. Pintei tudo, tudo. O meu lápis mágico deu-me cores que eu nem sabia existir, e com elas pude pintar mais do que alguma vez algum menino poderá pintar numa folha de papel: desenhei a felicidade, a alegria, a esperança, desenhei o amor. Por momentos, senti-me um pouco triste porque percebi que daí a nada acabaria o desenho e mesmo eu não poderia ficar ali para sempre. Então, peguei no meu lápis e desenhei-me, no cimo de uma pequena colina, e com o meu lápis desenhei o meu lápis, na minha mão. Nessa altura, o lápis tornou-se cor de fogo, e pintei um coração no peito do eu desenhado.
Ele ganhou vida, e logo desatou a abanar o lápis no ar, mas aquele lápis desenhado não tinha cor. Soube o que tinha que fazer: criei uma enorme ponte de corda até à minha nuvem e, uma vez ao lado do meu boneco vivo, dei-lhe, em mãos, o meu lápis mágico. Eu olhei para mim e sorri. À minha volta o meu quadro ganhara vida e eu já não sabia o que era real ou não. Já nem sabia quem era o verdadeiro eu. A verdade é que isso não importa muito; a realidade é muitas vezes uma coisa cinzenta, mas se tivermos na mão um pedaço de magia e imaginação, tudo pode ser transformado. Quando percebi isto, sorri novamente; e no ar surgiu um imenso arco-íris, que nascia em lado nenhum e terminava muito para lá do que será alguma vez descoberto.
enganar assim; mas não me importei, afinal tinha tido muitos presentes, muito bons.
Chovera a noite toda; de manhã, quando acordei, a terra estava molhada, as nuvens continuavam cinzentas e um Sol tímido ia espreitando por entre elas, mas mal ganhava um pouco mais de coragem, era logo tapado. Ao pé de minha casa havia um sítio que eu gostava imenso; era uma espécie de colina, não muito alta mas que dava uma imagem linda do céu, totalmente livre de prédios e antenas e telhados e essas coisas dos homens que só estragam paisagens. Tinha lá também um pequeno parque infantil com baloiços, onde muitas vezes me sentava a olhar aquela bonita imagem. Pedi à mãe para ir para lá e, como era mesmo muito perto, a mãe deixou, como aliás costuma deixar sempre. Da janela da cozinha até podia ir-me vendo, por isso, nunca houve problema. Fui para lá então, sentar-me no meu baloiço; quando me sentei, senti uma coisa bicuda no bolso e fui ver o que seria... era o lápis do Padrinho! Não me lembrava de o ter posto no bolso, mas na verdade não me lembrava do que realmente lhe tinha feito. Fiquei com ele na mão, também era má-educação deitá-lo fora, apesar de ter mil e quinhentos lápis de carvão. Olhei para o meu céu. Nuvens imensas pairavam no ar, tão grandes e pesadas que me admirei como não caíam ao chão e se mantinham lá em cima, a voar. Eu sou bem mais pequenino e nunca consegui... Cada uma dessas enormes nuvens era de um cinzento muito escuro, curiosamente da cor do meu lápis de carvão. Quando olhei para ele para fazer esta comparação, não quis acreditar nos meus olhos! O lápis tinha-se transformado num lápis de cera branco.
Sem saber se devia ficar assustado ou admirado ou contente, fiquem a olhar para ele. Virei-o, aproximei-o dos olhos, afastei-o, bati com ele nos ferros do baloiço, até o trinquei; era real e era mesmo branco, um branco de uma pureza que eu nunca tinha visto. Sem saber bem o que esperar ao fazer aquilo, comecei a agitá-lo no ar. E atrás dele vinha um feixe de luz! Parecia uma varinha mágica. Baixei-o o tornei a olhar para ele atentamente. Na minha cabeça fervilhavam emoções e sei lá mais o quê, não sabia mesmo o que se estaria ali a passar. Quando olhei para o céu novamente, vi algo muito estranho: uma enorme nuvem, que há pouco tinha parado ali mesmo em frente, suspensa, tinha uns riscos brancos esquisitos, sem ordem. Olhei para o lápis, e de novo para a nuvem. Experimentei de novo uns movimentos no ar, e confirmou-se: eu podia pintar a nuvem com o meu lápis. Não quis saber de mais nada, nem se seria um sonho, nada. Pus-me a pintar toda a nuvem, que num instante deixou de ser cinzenta e feia para passar a ser um imenso quadro do branco mais branco que já existiu. Sentei-me no baloiço e olhei para o meu lápis mágico e para a brancura da nuvem. Fixei de novo o lápis e, nova surpresa: tinha-se tornado verde.
Com o meu lápis mágico pintei então planícies e colinas, tudo no meu imenso papel branco, a minha nuvem. Era uma relva fresca, muito bonita. Depois o meu lápis ficou azul, e dentro da nuvem pintei o céu, limpo, um céu de Verão. Ainda com o azul do meu lápis pintei um enorme rio que nascia lá ao longe no horizonte vinha dar a um lago muito grande, onde depois, com o rosa que veio a seguir, pintei flores na sua margem e borboletas enormes que mais pareciam fadas! Quanto mais depressa eu desenhava mais rapidamente o meu lápis mudava de cor. Logo a seguir ao rosa veio o castanho, e eu pintei barquinhos no meu lago. Logo depois ficou amarelo! E eu desenhei um enorme e quente Sol, cuja luz saiu do meu quadro e iluminou tudo o que era possível ao meu olhar alcançar. Pintei tudo, tudo. O meu lápis mágico deu-me cores que eu nem sabia existir, e com elas pude pintar mais do que alguma vez algum menino poderá pintar numa folha de papel: desenhei a felicidade, a alegria, a esperança, desenhei o amor. Por momentos, senti-me um pouco triste porque percebi que daí a nada acabaria o desenho e mesmo eu não poderia ficar ali para sempre. Então, peguei no meu lápis e desenhei-me, no cimo de uma pequena colina, e com o meu lápis desenhei o meu lápis, na minha mão. Nessa altura, o lápis tornou-se cor de fogo, e pintei um coração no peito do eu desenhado.
Ele ganhou vida, e logo desatou a abanar o lápis no ar, mas aquele lápis desenhado não tinha cor. Soube o que tinha que fazer: criei uma enorme ponte de corda até à minha nuvem e, uma vez ao lado do meu boneco vivo, dei-lhe, em mãos, o meu lápis mágico. Eu olhei para mim e sorri. À minha volta o meu quadro ganhara vida e eu já não sabia o que era real ou não. Já nem sabia quem era o verdadeiro eu. A verdade é que isso não importa muito; a realidade é muitas vezes uma coisa cinzenta, mas se tivermos na mão um pedaço de magia e imaginação, tudo pode ser transformado. Quando percebi isto, sorri novamente; e no ar surgiu um imenso arco-íris, que nascia em lado nenhum e terminava muito para lá do que será alguma vez descoberto.
Bolo-Rei
O brinde de um bolo-rei é exactamente como o amor. Sem ele, não corremos o risco de nos magoar, mas a verdade é que o todo deixa de ter piada.
domingo, 17 de outubro de 2010
Baú
Adormeci embalado pelo bater na chuva na janela, chuva que sendo objecto último do eu acordado candidatou-se a ser o primeiro do eu a sonhar, e foi. No sonho estava no meu quarto, o mesmo em que adormecera; mas, para além da cama, nada ali mais havia senão um pequeno baú gasto por um tempo que, ao que parece, também corre no mundo dos adormecidos. Quando vi o baú, não me perguntei porque estaria ali um baú, nem perguntei onde estaria a mobília que deveria estar no lugar do baú. Pois, é que nos sonhos não se fazem perguntas, só se sonha. E eu sonhei dentro do sonho, algo a que um bom matemático chamaria um sonho ao quadrado, ou a que um bom mestre de Letras chamaria pleonasmo. Eu não lhe chamei nada, porque lá está, por ali só se sonha. Bom, ao ver um baú sonhei que era um pirata. Até tinha um papagaio ao ombro! E como um bom pirata que não sou mas fui, imaginei tesouros dentro do baú, muitas moedas de cobre, cálices de prata, medalhões de ouro! Mais, e porque fui um pirata muito moderno, imaginei que lá dentro pudessem estar chaves de grandes barcos a motor (os outros nunca precisaram de chave, só de vontade)e até de automóveis topo de gama, que em terra também se passeia bem e descobrir , tudo pode ser descoberto, visto que nada é conhecido. Desejei que dentro do baú pudesse estar tudo isto, e porque não roupas caras, bons sapatos, algumas maquinetas. Na verdade, desejei ter tudo. Foi nisso que pensei antes de abrir o baú. Quero ter tudo. Quero ser e conhecer todos, viajar mesmo que sem os tais barcos. De súbito, não me senti pirata mas poeta; sei que era poeta porque nada tinha de meu e sentia-me dono de tudo, dos sentimentos, e apesar de ter amor, faltava-me que eu amava. Mais, ao pensar nisto, logo um formigueiro me assolou a ponta dos dedos, como se estivessem ao lume, e fogos destes só se apagam de uma maneira, quem é poeta sabe qual é. Como queria ter tudo, talvez ao abrir o baú encontrasse lá um papel e uma caneta, desejei que sim. Ou talvez estivesses lá tu. Não cheguei a descobrir, porque nos sonhos não se descobrem coisas, porque antes de se descobrir... Acorda-se.
sábado, 16 de outubro de 2010
Perífrases
Não quero nada com antíteses
Cheio estou de tanto nada
Que é isso de paradoxos, metáforas?
Gelos quentes são essas anáforas
Tão complicadas
Tão sem porquê
Tão mudas, caladas!
Não preciso de nomes eruditos
Falo, poetiso, como quero.
E se é o teu coração que espero
Só te digo, tranquilo:
Amo-te!
Sem nenhuma figura de estilo.
Cheio estou de tanto nada
Que é isso de paradoxos, metáforas?
Gelos quentes são essas anáforas
Tão complicadas
Tão sem porquê
Tão mudas, caladas!
Não preciso de nomes eruditos
Falo, poetiso, como quero.
E se é o teu coração que espero
Só te digo, tranquilo:
Amo-te!
Sem nenhuma figura de estilo.
Celestial poesia
O poema é como o céu.
É um mundo imenso!
De beleza intenso
Tem um corpo só seu
E uma alma, que é a Lua
Que nem é minha nem é tua
Não é de ninguém!
É só de toda a gente.
E tem estrelas de luz quente.
As que se vêm, jóias a luzir,
E outras, escondidas
Mas não as penses perdidas!
Existem - para nunca se descobrir.
É um mundo imenso!
De beleza intenso
Tem um corpo só seu
E uma alma, que é a Lua
Que nem é minha nem é tua
Não é de ninguém!
É só de toda a gente.
E tem estrelas de luz quente.
As que se vêm, jóias a luzir,
E outras, escondidas
Mas não as penses perdidas!
Existem - para nunca se descobrir.
sexta-feira, 15 de outubro de 2010
Círculo
Como a toupeira que escava
Sem saber onde vai parar
Eu escrevo, olho fechado
Convicto (ou esperançado?)
Que um dia hei-de lá chegar.
Sem saber onde vai parar
Eu escrevo, olho fechado
Convicto (ou esperançado?)
Que um dia hei-de lá chegar.
quarta-feira, 13 de outubro de 2010
Boa noite
Cai o Sol, é Lua aurora
Um tempo que é só teu.
Lá de longe
Vem o sono devagarinho
E a mamã, a mamã
Está aqui perto
Para te aconchegar.
Um tempo que é só teu.
Lá de longe
Vem o sono devagarinho
E a mamã, a mamã
Está aqui perto
Para te aconchegar.
Perdição
Não olhes para mim.
Por favor, não olhes!
Não sorrias.
Não faças dos teus lábios janela para a tua alma.
Não, não te aproximes.
Não me dês daquelas palpitações, daqueles suores frios.
Eu nem te conheço...
Não, a sério, não me faças querer amar-te.
Não te quero prometer reinos nem fazer de ti princesa.
Quer dizer, quero. Só não quero querer.
Não me quero apaixonar, por isso não me estendas a mão.
Não, não quero o teu perfume, não quero sonhar com ele.
Não me toques, não me enfeitices.
Imploro-te.
Estás tão longe, vamos manter tudo assim.
Não, não quer... ah!, olhaste.
Por favor, não olhes!
Não sorrias.
Não faças dos teus lábios janela para a tua alma.
Não, não te aproximes.
Não me dês daquelas palpitações, daqueles suores frios.
Eu nem te conheço...
Não, a sério, não me faças querer amar-te.
Não te quero prometer reinos nem fazer de ti princesa.
Quer dizer, quero. Só não quero querer.
Não me quero apaixonar, por isso não me estendas a mão.
Não, não quero o teu perfume, não quero sonhar com ele.
Não me toques, não me enfeitices.
Imploro-te.
Estás tão longe, vamos manter tudo assim.
Não, não quer... ah!, olhaste.
aMar
Vai chegar o dia em que tomarei o barco sem temer nunca pisar os grãos de areia que ficaram por pisar. Os ares que não respirei, as aromas que não cheirei, os sabores que não provei, nada disso terá importância e não me impedirão de querer avançar para as cataratas que, mais à frente, se apresentam. Ainda assim, nesse dia, olharei o céu; e talvez sonhe não com aquilo que vem depois da morte, mas com o que está para além da vida. E não quererei morrer.
terça-feira, 12 de outubro de 2010
Querido Pai Natal
Sei que não existes, por isso nem me importo por te estar a escrever esta carta ainda longe do Natal. De qualquer das maneiras, a prenda que te quero pedir, o desejo que gostaria de ver realizado, é impossível de realizar, logo penso que só uma pessoa que não existe o pode concretizar.
Na minha televisão já aparecem muitos anúncios de bonecos e jogos. Até pensei que o tempo tivesse voado e fui perguntar à mãe, mas não, ainda é mesmo início de Outubro. Talvez haja meninos que têm o Natal mais cedo e então precisem de fazer as listas mais cedo; eu é que já sou crescidinho, e só tenho um desejo a pedir. Estava a ver estes anúncios e depois começou o telejornal. Normalmente nesta altura levanto-me e vou brincar ou assim, mas não consegui. Começou a dar umas imagens de meninos e meninas muito doentes, porque, disse lá o senhor, comiam muito pouco. Até achei esquisito, afinal tinham as barrigas grandes. Mas realmente pareciam doentes. Apeteceu-me chorar, porque pensei que aqueles meninos não devem ter Natal nunca, nem devem poder pedir prendas e desejos. Se existisses, realizarias na mesma?
Mesmo que não realizasses, eles deviam poder pedir. Eu quando peço um brinquedo ou um chocolate, mesmo que não o tenha, fico por um bocadinho a pensar que o vou ter e fico contente. Aqueles meninos deveriam ficar felizes nem que fosse com um bocadinho de alegria, esperança.
Não sei bem o que vou fazer a esta carta. Para onde se mandam as cartas sem se saber para onde se mandar? Já sei, vou atirá-la pela janela. Está muito vento, de certeza que a vai levar para muito muito longe. Não vai ser aberta por ninguém, e como tu não és ninguém, bate tudo certo. E talvez assim possas realizar o meu desejo.
A mãe está a chamar-me para ir lanchar. Agora sempre que como penso naqueles meninos, gostava de ser mais crescido para os ajudar. Ainda bem que existo, assim um dia vou crescer e vou poder ajudar. Deve ser difícil ser-se tu, toda a gente te pede tudo e tu não podes fazer nada. Vou embora.
Ass: Tomás.
P.S.: Esqueci-me do meu desejo.
Na minha televisão já aparecem muitos anúncios de bonecos e jogos. Até pensei que o tempo tivesse voado e fui perguntar à mãe, mas não, ainda é mesmo início de Outubro. Talvez haja meninos que têm o Natal mais cedo e então precisem de fazer as listas mais cedo; eu é que já sou crescidinho, e só tenho um desejo a pedir. Estava a ver estes anúncios e depois começou o telejornal. Normalmente nesta altura levanto-me e vou brincar ou assim, mas não consegui. Começou a dar umas imagens de meninos e meninas muito doentes, porque, disse lá o senhor, comiam muito pouco. Até achei esquisito, afinal tinham as barrigas grandes. Mas realmente pareciam doentes. Apeteceu-me chorar, porque pensei que aqueles meninos não devem ter Natal nunca, nem devem poder pedir prendas e desejos. Se existisses, realizarias na mesma?
Mesmo que não realizasses, eles deviam poder pedir. Eu quando peço um brinquedo ou um chocolate, mesmo que não o tenha, fico por um bocadinho a pensar que o vou ter e fico contente. Aqueles meninos deveriam ficar felizes nem que fosse com um bocadinho de alegria, esperança.
Não sei bem o que vou fazer a esta carta. Para onde se mandam as cartas sem se saber para onde se mandar? Já sei, vou atirá-la pela janela. Está muito vento, de certeza que a vai levar para muito muito longe. Não vai ser aberta por ninguém, e como tu não és ninguém, bate tudo certo. E talvez assim possas realizar o meu desejo.
A mãe está a chamar-me para ir lanchar. Agora sempre que como penso naqueles meninos, gostava de ser mais crescido para os ajudar. Ainda bem que existo, assim um dia vou crescer e vou poder ajudar. Deve ser difícil ser-se tu, toda a gente te pede tudo e tu não podes fazer nada. Vou embora.
Ass: Tomás.
P.S.: Esqueci-me do meu desejo.
domingo, 10 de outubro de 2010
Engano
Palavras ilusórias
E sonhos envenenados
Como as meninas que cortejam
Os rapazes envergonhados.
E sonhos envenenados
Como as meninas que cortejam
Os rapazes envergonhados.
Ode aos anónimos
História cheia está
De heróis muito cantados
Feitos grandes, fadados
Ditos, "Iguais não há!".
Esses de versos já fartam
Já estão imortalizados.
Quero falar de quem vós calais
Grandes, comuns mortais
Que permanecem calados!
Todos os que de trovador
Ou de cronista, cantador
Foram orfãos em tempo de glória
Ouçam dos vermes este poema
Pois é de poetas grande lema
Que quem foi, deve ser memória!
Tu que vidas salvaste
Ou tu, que coração aqueceste
Saboreando enquanto sabor agreste
E amor, nunca provaste.
E vós, milhões mortos de ódio
Perdidos em paredes de rocha
Ilumino-vos eu, com minha tocha.
Saiam, subam ao pódio!
Larguem as sepulturas de terra!
Que hão-de ser ouvidos no alto Céu
Hão-de ser vistos da alta serra
Projectados deste cantar meu.
De heróis muito cantados
Feitos grandes, fadados
Ditos, "Iguais não há!".
Esses de versos já fartam
Já estão imortalizados.
Quero falar de quem vós calais
Grandes, comuns mortais
Que permanecem calados!
Todos os que de trovador
Ou de cronista, cantador
Foram orfãos em tempo de glória
Ouçam dos vermes este poema
Pois é de poetas grande lema
Que quem foi, deve ser memória!
Tu que vidas salvaste
Ou tu, que coração aqueceste
Saboreando enquanto sabor agreste
E amor, nunca provaste.
E vós, milhões mortos de ódio
Perdidos em paredes de rocha
Ilumino-vos eu, com minha tocha.
Saiam, subam ao pódio!
Larguem as sepulturas de terra!
Que hão-de ser ouvidos no alto Céu
Hão-de ser vistos da alta serra
Projectados deste cantar meu.
sábado, 9 de outubro de 2010
Sorri
Abres um sorriso
E mil se abrem também.
Sorri o mar, e és tu mãe
Dos sorrisos que enchem o ar.
Varre a terra a alegria
Não és maga nem feiticeira
Mas tens dotes de magia
Que me contagia de uma maneira...
Nunca te zangues com o mundo;
Ele precisa de ti para se alegrar!
E ainda que mergulhado no breu fundo
Basta a tua boca para o iluminar.
E também eu, ó musa encantada
Como poeta sedento de inspiração
Preciso do teu toque de fada
Sorri, enche-me o coração.
E mil se abrem também.
Sorri o mar, e és tu mãe
Dos sorrisos que enchem o ar.
Varre a terra a alegria
Não és maga nem feiticeira
Mas tens dotes de magia
Que me contagia de uma maneira...
Nunca te zangues com o mundo;
Ele precisa de ti para se alegrar!
E ainda que mergulhado no breu fundo
Basta a tua boca para o iluminar.
E também eu, ó musa encantada
Como poeta sedento de inspiração
Preciso do teu toque de fada
Sorri, enche-me o coração.
quarta-feira, 6 de outubro de 2010
Simplezas
O meu fruto preferido era o pêssego. Adorava a suavidade da sua polpa, o sabor doce e aveludado, o aroma fresco que tem. Há três anos, um velho agricultor deu-me um pé de laranjeira, que este ano deu finalmente fruto. Agora o meu fruto preferido é a laranja. Adoro a frescura do seu sumo, a acidez do seu sabor, o toque áspero da sua casca, o cheiro agradável a manhã que transmite. Hoje plantei um morangueiro. Se a árvore deixar de dar fruto, pode ser que amanhã o meu fruto preferido seja o morango; e eu vou adorar a sua cor apaixonante, o seu sabor acompanhado com ele ou com natas ou açucar, a sua pequenez engraçada.
Cicatrizes
Na morgue estavam dois corpos, o de um homem e o de uma mulher. Nunca em vida haviam estado juntos e não deixa de ser curioso que seja no sono eterno que estes dois se conheçam. Mórbido talvez, mas curioso sem sombra de dúvida. Era díficil dizer quem era a mulher, ou melhor, quem tinha sido, que feitos teria realizado aquele corpo outrora recheado com uma alma. Podia apenas ver-se que havia sido submetida a várias intervenções cirúrgicas plásticas, daquelas que tentam combater as marcas do tempo e cujos resultados podem ser questionados. Em morte, pelo menos, de pouco lhe valia. A falta de manutenção dessas operações e desse processo de rejuvenescimento ilusório levava a que a sua expressão fosse até mais bizarra que o seria se tivesse o rosto de uma simples senhora de 80 anos. Já o homem, esse, também possuía estranhas marcas. Mas, ao contrário da mulher, essas eram naturais; no braço, podia ver-se desenhada uma dentada, aparentemente de tubarão, ou crocodilo, ou outro animal feroz, que de dentadas pouco entendo. Ao longo da face um longo corte, talvez fruto de uma dura batalha com um samurai, ou mesmo de uma queda aquando da exploração de uma floresta tropical virgem. Na mão esquerda faltava-lhe um dedo, o polegar, sabe-se lá quem o terá devorado. O tronco e as pernas apresentam outros sinais de igual natureza, uns maiores, outros mais pequenos. Em vida, comparados, muita gente entendida teria descrito o corpo da senhora como mais belo, a nível estético. Agora, que de pouco serve a uma qualquer passerelle de moda, a mulher é desprovida de qualquer história, marca que pudesse agora valer-lhe um elogio. O homem, que outrora sem dúvida causara repulsa, tinha algo que a senhora nunca mais teria. Tinha medalhas de vida. Qualquer contador de histórias ou criança, deparada com aquele cadáver, podia imaginar e criar os mais mágicos e fantásticos contos e aventuras, sem nunca se arriscar a estar a fugir muito da verdade. E ao olhar-se para aqueles dois, podemos dizer que um teve uma vida e que o outro... a viveu.
terça-feira, 5 de outubro de 2010
Nas nuvens
Estou deitado e na mente nasce
Poema que te quero dedicar.
Estás longe e eu de sentidos amarrado
Só te querendo, sou desprezado
Por isso, quieto, quero voar.
Nada me dás, mas vou ser rendado
Serão os melhores versos que eu criar.
Ensinaste-me a só te querer
É altura de eu professor ser
Quero ser no teu ser, lar.
Dizem que já não sei que digo
Dizem que tenho a cabeça na lua!
Mas aqui embaixo é tudo real
Que sejas sonho, não faz mal
A minha cabeça, está na tua.
Poema que te quero dedicar.
Estás longe e eu de sentidos amarrado
Só te querendo, sou desprezado
Por isso, quieto, quero voar.
Nada me dás, mas vou ser rendado
Serão os melhores versos que eu criar.
Ensinaste-me a só te querer
É altura de eu professor ser
Quero ser no teu ser, lar.
Dizem que já não sei que digo
Dizem que tenho a cabeça na lua!
Mas aqui embaixo é tudo real
Que sejas sonho, não faz mal
A minha cabeça, está na tua.
domingo, 3 de outubro de 2010
Inocência
Queridos pais e irmã,
a vida na cidade tem sido óptima. Ainda a conheço mal e tudo é novidade, mas há por aqui muitas e muitas coisas mágicas. No outro dia fui passear à noite com o Ricardo e uns amigos dele; fomos de carro e, ao descer uma avenida (uma avenida é uma rua muito grande, existem algumas da largura dos pomares que aí temos!) descobri que aqui na cidade existem muitas e muitas estrelas de muitas e muitas cores e formas e tamanhos, luzinhas artificiais mas em nada menos bonitas que as estrelas que por aí temos. A companhia também era perfeita, e tenho reparado que quando estou com o Ricardo tudo me parece assim bonito, não sei porque. É esquisito, mas claro, sabe bem! Nessa noite eu estava sentada num dos lugares de trás e, numa altura em que parámos num semáforo, os nossos olhares pousaram por acaso um no outro através do espelho do carro, e sabem uma coisa? Os olhos dele brilhavam como as estrelinhas da cidade, e logo de seguida também a boca dele brilhou assim. O meu coração também acelerou, mas isso deve ter sido por causa da velocidade a que o carro ía, não estou habituada a estas andanças.
Com amor,
Raquel.
Alguns meses depois.
Queridos pais e irmã,
desde a última carta as coisas não têm corrido muito bem. Baixei um pouco as notas e ando sem apetite; aqueles momentos bonitos foram escasseando e a vida já não é tão bela. A semana passada, o Ricardo apareceu com uma namorada, desde esse dia nunca mais lhe vi o brilhinho nos olhos, nem me voltou a acelerar o coração, nem continuo a achar bonitas as luzinhas da cidade. Apeteceu-me chorar e não sei porque, devia ter ficado feliz, não era? A verdade é que, numa altura em que todo este mundo devia começar a ser um lar, me sinto mais sozinha e desamparada do que nunca. Agora que penso nisso, pouco me prende aqui. A novidade de vir estudar para Lisboa já não me excita, já não sei se quero tirar mesmo este curso. Acho que vou voltar para casa...
Raquel.
a vida na cidade tem sido óptima. Ainda a conheço mal e tudo é novidade, mas há por aqui muitas e muitas coisas mágicas. No outro dia fui passear à noite com o Ricardo e uns amigos dele; fomos de carro e, ao descer uma avenida (uma avenida é uma rua muito grande, existem algumas da largura dos pomares que aí temos!) descobri que aqui na cidade existem muitas e muitas estrelas de muitas e muitas cores e formas e tamanhos, luzinhas artificiais mas em nada menos bonitas que as estrelas que por aí temos. A companhia também era perfeita, e tenho reparado que quando estou com o Ricardo tudo me parece assim bonito, não sei porque. É esquisito, mas claro, sabe bem! Nessa noite eu estava sentada num dos lugares de trás e, numa altura em que parámos num semáforo, os nossos olhares pousaram por acaso um no outro através do espelho do carro, e sabem uma coisa? Os olhos dele brilhavam como as estrelinhas da cidade, e logo de seguida também a boca dele brilhou assim. O meu coração também acelerou, mas isso deve ter sido por causa da velocidade a que o carro ía, não estou habituada a estas andanças.
Com amor,
Raquel.
Alguns meses depois.
Queridos pais e irmã,
desde a última carta as coisas não têm corrido muito bem. Baixei um pouco as notas e ando sem apetite; aqueles momentos bonitos foram escasseando e a vida já não é tão bela. A semana passada, o Ricardo apareceu com uma namorada, desde esse dia nunca mais lhe vi o brilhinho nos olhos, nem me voltou a acelerar o coração, nem continuo a achar bonitas as luzinhas da cidade. Apeteceu-me chorar e não sei porque, devia ter ficado feliz, não era? A verdade é que, numa altura em que todo este mundo devia começar a ser um lar, me sinto mais sozinha e desamparada do que nunca. Agora que penso nisso, pouco me prende aqui. A novidade de vir estudar para Lisboa já não me excita, já não sei se quero tirar mesmo este curso. Acho que vou voltar para casa...
Raquel.
Nascimento
Uma paixão e um despedaçar
Coisas do amor, nem sempre bom
Nasce, do fundo do ser para o ar
Um choro que tem de silêncio tom.
Talvez triste seja o desamor
Que nunca é de alegria profeta
Mas se de morte se conhece sabor
Pelo menos nasce um poeta.
Coisas do amor, nem sempre bom
Nasce, do fundo do ser para o ar
Um choro que tem de silêncio tom.
Talvez triste seja o desamor
Que nunca é de alegria profeta
Mas se de morte se conhece sabor
Pelo menos nasce um poeta.
Atmosferas
As minhas recentes odes à chuva foram ouvidas pelos deuses. Agora podemos ir à janela e respirar um ar limpo, sentir uma frescura na cara que nos inspira a escrever sobre tudo mas eu, como sou generoso e grato, prefiro escrever sobre ela mesma. Já tinha saudades desta atmosfera, de ver actividade natural, ver as danças das gotinhas de água; dou por mim a dar-lhes histórias e percursos de vida, afinal o ciclo da água pode já ter levado estas gotinhas até ao outro lado do mundo! E eu, fechado, faço essas mesmas viagens. Basta inspirar bem fundo e manter o ar cá dentro, de olhos fechados. Viaja-se tanto parado, porquê correr e não ir a lado nenhum?
Ser
Quem escreve versos
Planta sonhos
Semeia emoções
Desperta corações
Reúne os dispersos
Traz à tona os submersos
Tece panos de algodão
Estende ao só uma mão
Torna-nos em si imersos
Pinta o escuro
Abre uma luz brilhante
Derruba mil e um muro
Traça a lápis uma constante
Abre no morto um furo
Estende um tapete vermelho
Faz do amor uma prova
Torna o novo velho
Traz da antiga coisa nova
Aconchega em pedra fria
Chora num riso contente
Jura que por eles morria
É alguém igual e diferente
Porque ser poeta é ser-se tudo
É amar escrito em papel
É gritar sendo mudo
Fazer do amargo, mel.
Planta sonhos
Semeia emoções
Desperta corações
Reúne os dispersos
Traz à tona os submersos
Tece panos de algodão
Estende ao só uma mão
Torna-nos em si imersos
Pinta o escuro
Abre uma luz brilhante
Derruba mil e um muro
Traça a lápis uma constante
Abre no morto um furo
Estende um tapete vermelho
Faz do amor uma prova
Torna o novo velho
Traz da antiga coisa nova
Aconchega em pedra fria
Chora num riso contente
Jura que por eles morria
É alguém igual e diferente
Porque ser poeta é ser-se tudo
É amar escrito em papel
É gritar sendo mudo
Fazer do amargo, mel.
Vazio
Cor e barulho e alegria
Ela, que não me contangia.
Porque nada vejo ou escuto
Nem que tivera ouvido astudo
Porque não existe melodia.
Os olhos cegam de tanto ver
Os ouvidos doem, do frenesim
E se resolvessem meter um muro
Ou mergulhar-me no fundo escuro
Veria mais, posso crer.
Porque é no breu que se pensa
É do nada que nasce a poesia
Ouvir pensamentos, qual magia
O dia é só indiferença
É o nada que procria.
Ela, que não me contangia.
Porque nada vejo ou escuto
Nem que tivera ouvido astudo
Porque não existe melodia.
Os olhos cegam de tanto ver
Os ouvidos doem, do frenesim
E se resolvessem meter um muro
Ou mergulhar-me no fundo escuro
Veria mais, posso crer.
Porque é no breu que se pensa
É do nada que nasce a poesia
Ouvir pensamentos, qual magia
O dia é só indiferença
É o nada que procria.
sexta-feira, 1 de outubro de 2010
Talvez
O banco estava frio e a chuva caía copiosamente. Mas o rapaz, contrariamente ao esperado, não mexeu um musculo; ou melhor, mexia vários, mas nenhum quis que ele se levantasse e se abrigasse do temporal. As pernas tremiam-lhe, a cabeça olhava em volta constantemente, como quem espera ver algo de diferente ou alguém a chegar. Suspirava, e serão na cara dele lágrimas ou é a água celestial que o faz parecer?
Estava naquele banco faziam horas. Chegara alegre, nervoso, sim, mas aquele nervoso que podemos adivinhar ser de algo bom. Aquele nervoso que até levou o rapaz a, quando quis falar a alguém que conhecia, fazer uma careta esquisita e não ser capaz de articular uma frase coerente. A felicidade que trouxera foi desaparecendo à mesma medida que o Sol tímido se foi escondendo atrás das nuvens, que se foram carregando e acizentando juntamente com o semblante do jovem.
A chuva carregava, a noite chegava e o rapaz não se decidia a ir embora; já não olhava em volta, percebe-se que a esperança já não é o que o mantém ali. Não se percebe, na verdade, o que será; as lágrimas já nem pela chuva são disfarçadas e as pernas, fracas, já não tremem. O olhar está fixo num ponto inexistente, cheio de um vazio que nos deixa adivinhar pensamentos bem profundos ou um adormecimento sem sonhos, nem pesadelos.
A dada altura, o rapaz sorri. Não é um sorriso feliz, é um sorriso irónico, frio, escuro. Talvez percebera, com mágoa, que há coisas que parecem tirar o sentido à vida; há coisas que fazem com que frio e chuva e noite cerrada deixem de ser um problema, uma preocupação. Talvez o rapaz tenha chegado à conclusão que não valia e pena ir para casa porque o seu lar havia ruído, despedaçado sob a força cruel da indiferença. Talvez o banco fosse o que mais o ligasse à luz ao fundo de um túnel que de repente ficou a negro.
Talvez. Com isto, não se sabe para onde terá ido. Em boa verdade, não se sabe sequer se terá ido. Ficar, também não ficou.
No dia a seguir o banco foi ocupado por um velhote que passeava o cão, mais tarde por uma mãe com o seu bebé, e ainda por um casal de namorados. O dia foi de Sol e calor e Primavera. A chuva limpara as lágrimas e nunca ninguém soube dos desamores que o banco acolhera. Falasse o banco e talvez soubéssemos do destino que pobre rapaz que o perdera por completo.
Dizem que a pedra não tem vida, não tem cor, não tem cheiro, não tem calor, não tem sangue, coração. Mas tem muito que contar; e dura para sempre.
Estava naquele banco faziam horas. Chegara alegre, nervoso, sim, mas aquele nervoso que podemos adivinhar ser de algo bom. Aquele nervoso que até levou o rapaz a, quando quis falar a alguém que conhecia, fazer uma careta esquisita e não ser capaz de articular uma frase coerente. A felicidade que trouxera foi desaparecendo à mesma medida que o Sol tímido se foi escondendo atrás das nuvens, que se foram carregando e acizentando juntamente com o semblante do jovem.
A chuva carregava, a noite chegava e o rapaz não se decidia a ir embora; já não olhava em volta, percebe-se que a esperança já não é o que o mantém ali. Não se percebe, na verdade, o que será; as lágrimas já nem pela chuva são disfarçadas e as pernas, fracas, já não tremem. O olhar está fixo num ponto inexistente, cheio de um vazio que nos deixa adivinhar pensamentos bem profundos ou um adormecimento sem sonhos, nem pesadelos.
A dada altura, o rapaz sorri. Não é um sorriso feliz, é um sorriso irónico, frio, escuro. Talvez percebera, com mágoa, que há coisas que parecem tirar o sentido à vida; há coisas que fazem com que frio e chuva e noite cerrada deixem de ser um problema, uma preocupação. Talvez o rapaz tenha chegado à conclusão que não valia e pena ir para casa porque o seu lar havia ruído, despedaçado sob a força cruel da indiferença. Talvez o banco fosse o que mais o ligasse à luz ao fundo de um túnel que de repente ficou a negro.
Talvez. Com isto, não se sabe para onde terá ido. Em boa verdade, não se sabe sequer se terá ido. Ficar, também não ficou.
No dia a seguir o banco foi ocupado por um velhote que passeava o cão, mais tarde por uma mãe com o seu bebé, e ainda por um casal de namorados. O dia foi de Sol e calor e Primavera. A chuva limpara as lágrimas e nunca ninguém soube dos desamores que o banco acolhera. Falasse o banco e talvez soubéssemos do destino que pobre rapaz que o perdera por completo.
Dizem que a pedra não tem vida, não tem cor, não tem cheiro, não tem calor, não tem sangue, coração. Mas tem muito que contar; e dura para sempre.
Ninho
E sinto neste momento uma impagável sensação de protecção, não de um escudo, não de uma muralha, não de uma torre, não de uma arma, mas da minha colcha, que me protege do frio e dos pesadelos e daquilo que o escuro esconde e a que nós em pequeninos chamamos Papão.
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