domingo, 6 de março de 2011
A placa de esferovite
Sempre amei o passado, e quando amamos muito uma coisa gostamos de olhar para ela. Um olhar diferente, uma contemplação, um adorar sem vénia mas muito, muito intenso. Fala-se imenso no beijo, no dar a mão, em carinhos e oferendas, mas não tanto neste gesto, pela simples razão de pouco ter de físico. Mas há coisas que só podem ser olhadas, lá está o passado. Tenho então no quarto uma imensa placa de esferovite onde, com alfinetes de várias cores (uns mais coloridos que outros) vou postando fotos e objectos que imediatamente me levam para um outro tempo, e trazem-me cheiros e sons e sensações, talvez mais saborosas do que o foram no momento em que foram presente. E o meu quarto não tem espelho nem janela, só esta placa de esferovite. Os anos passaram-se e sempre prestei culto a esta placa, enriquecendo-a com pedaços de uma vida que eu fui vivendo fora de tempo. E antes de morrer, caí no abismo em vez de subir a escada, porque fiz todo o caminho a andar para à rectaguarda. Agora o passado é por mim ansiado, mas não por o querer reviver; simplesmente faria tudo para o mudar.
Subscrever:
Enviar feedback (Atom)
Não sabes o quanto me identifico com este texto...
ResponderEliminar"Agora o passado é por mim ansiado, mas não por o querer reviver; simplesmente faria tudo para o mudar." Definitivamente.
(Mais um muito bem "escrevido", monsieur :D)