domingo, 13 de fevereiro de 2011
Repetição
Carreguei no play, depois de ter colocado em mim a nossa pequena cassete. Claro que tive que fazer rewind, puxar a fita atrás, porque hoje tu és saudade e sempre o és desde que te tornaste ausência. Chegou ao início e sim, agora o play. Lá estavas, perdão, cá estavas tu, logo dentro de mim pouco depois de teres estado à frente. Lembro-me da primeira vez que te vi como se de facto as imagens passassem na minha televisão, passam na minha alma e vejo-as com os olhos que ela tem. No primeiro momento em que a minha vista pousou na tua houve uma pausa, uma pequena suspensão temporal, como se naquela altura um pintor tivesse pedido que parássemos um pouco para que ele recheasse uma tela com as emoções estranhas que de nós brotaram. Éramos jovens, crianças, e para as crianças amar é fácil, basta viver... Aqui torna-se ainda mais curiosa esta metáfora de que me lembrei para nos descrever. Enquanto não nascia um novo dia que me trouxesse de prenda a tua presença, a minha vida andava em slow motion, câmara lenta. Juro-te que até a água que ia buscar à torneira para me acalmar parecia demorar-se nos canos, malandra, perversa. O tempo brincava comigo e com o que sentia, e pior o fazia quando finalmente estávamos juntos. Acelerava, ele, o tempo. Mal te via já tinha que te virar as costas, e de novo o mesmo suplício do arrastar das horas. Num desses fogachos de tua presença no meu dia convidei-te para sair, e como sempre achei que cinemas eram pouco, levei-te a um jardim, que ainda é menos para quem achar que sim. Não interessa o que falámos porque não disse nada de jeito, o coração atropelava-me as palavras, interessa o beijo. Nova pausa. Essa eterna, pois tenho para mim que ainda hoje, agora mesmo, lá estamos os dois, perdidos um no outro, donos agora desse tempo que cruel brincara com o nosso amor de meninos. Perco mais tempo aqui que no resto do filme, é sempre assim nas melhores partes... Fast Forward agora, andar para a frente (tem mesmo que ser?...). Quanto tempo? Não sei quanto foi, nem quando. Parece que foi ontem, e mesmo que tenha sido parece ter sido há milhares de anos, muitos antes de ter inventado na minha vida isto dos filmes e dos botões. Agora, a dura realidade cai sobre mim e, enfim, apago a tela; posso voltar a atrás lembrando, mas não posso tornar a provar amanhã o mel que deitei fora ontem. A vida tem tantos botões, Deus, porque não criaste o da repetição?
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absolutamente FANTÁSTICOO!
ResponderEliminarExactamente para poder existir a palavra saudade. Com a qual começa... O teu texto.
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