quinta-feira, 5 de janeiro de 2012

O ladrão

O ladrão vagueia de noite
Quando os candeeiros sussurram luz.
Não se importa com vida ou coração
Ou com pobre decoração
O que ele só quer é roubar.

Assalta-me a cama que mais me protege
Que o quarto
Leva-me o que tenho
Que não é nada
Leva-me a alma, inacabada
Leva-me o fogo e deixa o lenho.

Que ladrão é este
Que até o meu amor leva consigo?
Não tomado
Dado como amigo.
Ladrão de meia-noite, que me inspira
Não é maldade o que respira
É sonho adocicado.

Oh ladrão, regressa
Volta a quem te deu a vida
E eis que verdade esquecida
Na minha mente tropeça:

O ladrão é meu
Porque o ladrão sou eu
Que fujo noite dentro, vagabundo
Por entre os poemas nocturnos fecundo
Letras que hão-de rimar.
Porque eu só quero sair
E roubar
Roubar matéria com que se escreva
Mas ai de mim que me atreva
A minha cama abandonar.

E o meu eu ladrão vai ficar de mim órfão
Sozinho há-de viver
Amar, andar, sofrer
Tudo olhar, tudo escrever
E eu aqui, como é de lei.

(Se ao menos eu tivesse asas,
Ou este chão fosse de brasas...)


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