segunda-feira, 1 de junho de 2015
Bodas de Trigo
Da sua margem, a única que conhecia, o menino viu um fogo que ardia do outro lado. Estranhamente, não o temeu. Não agradeceu a protecção do rio, não se confortou com a segurança da sua margem. Apaixonou-se por ele. Quis tê-lo, havia nele uma luz e um calor que não se vê no Sol, que ilumina a todos. Aquele fogo ardia somente para o menino e era isso que o chamava. Pelo nome. Quanto mais o menino amava mais o fogo ardia, quanto mais o menino se chegava à berma da margem mais alto o fogo se punha. Arrebatado, o menino lançou uma ponte frágil, de madeira. Nela pôs tudo de si pois já nada era seu sem aquela chama, nada lhe pertencia senão fazer parte daquele fogo. Lançou a ponte pensando-se alfaite, almejando fazer de duas margens uma, sem abismos para o rio. Mas tudo o que o menino tinha para dar foi pouco. Tanto ardeu o fogo seu que aos poucos, parecendo troçar da ilusão, lhe queimou a ponte, obrigando-o regressar à sua margem. Não o matou, nem de queda nem de queima, porque este fogo não mata, só se esfuma como as promessas que traz consigo. Agora, na sua margem, o menino descansa à sombra da árvore sua, só sua, embalado pelo canto do pássaro seu, só seu. Já não há fogo nem ponte, só fogos e pontes nas nuvens lá do céu. Até que chova.
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