domingo, 14 de junho de 2015

O mar

O mar olha para ti e chama-te pelo nome,
Ele o sabe e sabe quando precisas de o amar
E quanto. 
Canta as baladas tanto ensaiadas no mar
De amores dos corações dos poetas
Como as marés que de paragens secretas
Vêm sempre e sempre certas.

Protege-te sem te tocar, 
Dá-te a mão e colos doces
Quando só parece ter sal para dar.
Apaixona-te e tu ficas
Embalado, não queres ir
Porque se fosses 
Far-te-ia falta o mar.

E ele diz-te que tu a ele
Que de nada serve tanta água
Se não ferve por uma mágoa
Ou celebra qualquer beijo.

São um, 
Sentes o sangue ondas na praia.
És a corrente, 
Maior que a gente
Que assim não caia 
No voo
De se fazer ovo
No ninho azul.

E nascer de novo.

quarta-feira, 10 de junho de 2015

Alado

O pássaro canta para mim. Na sua poesia assobiada, sossega-me; pede-me que não tanto anseie voar como ele. Diz-me que também voo mas mais que isso caminho, e que nesse caminho abraço e dou a mão enquanto a ele tudo foge. Voam dele os amores e as cores ao longe são manchas até que poise, como eu, e até que a sua natureza num bater de asa o leve de novo ao céu. O leve de si. Chora-me paixões apontando-me as nuvens que só se vêem e mal são o que quer que seja, somente sonhos. Vai tecendo um canto que me embala e mostra que tenho o mundo na mão e a sua cara. Adormece-me, por fim, e faz-me sonhar, mostra-me que as minhas penas são beijos e eu voo na sua vez, rasgo os céus e amo-os, como nunca o pássaro poderá amar.

segunda-feira, 1 de junho de 2015

Bodas de Trigo

Da sua margem, a única que conhecia, o menino viu um fogo que ardia do outro lado. Estranhamente, não o temeu. Não agradeceu a protecção do rio, não se confortou com a segurança da sua margem. Apaixonou-se por ele. Quis tê-lo, havia nele uma luz e um calor que não se vê no Sol, que ilumina a todos. Aquele fogo ardia somente para o menino e era isso que o chamava. Pelo nome. Quanto mais o menino amava mais o fogo ardia, quanto mais o menino se chegava à berma da margem mais alto o fogo se punha. Arrebatado, o menino lançou uma ponte frágil, de madeira. Nela pôs tudo de si pois já nada era seu sem aquela chama, nada lhe pertencia senão fazer parte daquele fogo. Lançou a ponte pensando-se alfaite, almejando fazer de duas margens uma, sem abismos para o rio. Mas tudo o que o menino tinha para dar foi pouco. Tanto ardeu o fogo seu que aos poucos, parecendo troçar da ilusão, lhe queimou a ponte, obrigando-o regressar à sua margem. Não o matou, nem de queda nem de queima, porque este fogo não mata, só se esfuma como as promessas que traz consigo. Agora, na sua margem, o menino descansa à sombra da árvore sua, só sua, embalado pelo canto do pássaro seu, só seu. Já não há fogo nem ponte, só fogos e pontes nas nuvens lá do céu. Até que chova.