segunda-feira, 25 de julho de 2011

Medicação

O meu irmão pequenino está a gritar outra vez. Sabes, eu antes ia para o pé dele e tentava acalmá-lo, mas já desisti. Um dia bateu-me e tudo, mas nem foi na cara que isso mais magoou. Dói agora mesmo, que ouço os berros desesperados... já fechei a porta e pus fones nos ouvidos, mas os gritos permanecem na minha cabeça, talvez por eu sempre procurar se já cessaram. Desde que ele nasceu que ouvi os meus pais comentarem que ele tinha problemas, mas nunca percebi bem. Até certa altura, tudo parecia normal... depois, tudo começou. Sem razão aparente, tinha acessos de raiva; outras vezes, só dizia coisas sem sentido.Uma noite veio ter à minha cama, sem fazer barulho. Acordei de repente por causa da respiração dele na minha cara, tinha os olhos imensamente abertos. Assustei-me tanto! E começou a sussurrar há pessoas no meu quarto, há pessoas no meu quarto! E a voz foi aumentanto, vi bichos no tecto, cobras de baixo da cama! Daí a nada eram já berros, O ARMÁRIO ESTÁ A ARDER, E QUEIMA CÁ POR DENTRO! Entretanto os meus pais chegaram e levaram-no, enquanto o foram acalmando. Isto foi quando ele tinha cinco anos, tem agora oito. Sempre foi muito espero ele, principalmente na maneira de falar. Parecia muito mais velho. Numa manhã, aqui há uns dias, disse-me que gostava muito de mim e pediu desculpa por às vezes se portar tão mal. Disse ele que podia ser um bom menino e portar-se bem. E depois pediu-me uma coisa esquisita; mano, não deixes que ninguém me leve, por favor. Tenho medo dos senhores de branco... Calculei que fossem médicos, mas não consegui saber por que raio teria ele medo deles, ou porque recearia que alguém o levasse, pois entretanto a minha mão chegou ao pé de nós.

Os  gritos, que entretanto tinham parado, recomeçaram. Mas eram diferentes, agora. SOCORRO, SOCORRO, ouvia-se. JOÃO, MANO, SALVA-ME! O rapaz saiu do quarto e foi até ao do irmão; não tinha reparado no rebuliço que se tinha instalado. Estavam na casa um grupo de médicos que tinham vindo buscar o pequeno Pedro. João sabia que ele se recusara, nos últimos tempos, a ir ao hospital, e os crescentes ataques de raiva e alucinações deviam ter precipitado a necessidade de o internar. Assim que Pedro viu o irmão, estendeu os braços em busca de socorro, mas tinha dois homens a tentar prendê-lo a uma maca. A mãe chorava desconsolada, enquanto o pai tentava, em vão, acalmar o filho. Eles sabiam, e João também soube, que estavam a entrar num caminho sem retorno. E Pedro sentia-o também: Não os deixes, mano, não os deixes. Ajuda-me, salva-me, eles vão matar-me, ELES VÃO MATAR-ME. 
João não suportou o cenário e voltou para o quarto. Foi para a janela. Na televisão, alguém falava de Deus, diziam eles que Ele estava lá em cima e ouvia os nossos pedidos.


Não sei se existes, mas se estás mesmo aí em cima, por favor, ouve-me. Estão agora a levar o meu irmão para o hospital, e sei que ele vai ficar lá, preso. Criaste-nos para sermos presos em camas e comprimidos? Já nem te pergunto porque é que fizeste o meu maninho assim. Só te peço uma coisa, apesar de saber que é errada... por favor, leva a vida do meu irmão.

4 comentários:

  1. Anónimo1.8.11

    hey...tomei a liberdade de ler o teu texto sobre o teu irmão...
    É triste saber que o teu irmão tem alguns problemas...mas creio que não deves pedir que Ele lhe tire a vida...não sei qual é a gravidade do problema, mas deves ter um pouco mais de fé...acreditar que o teu irmão não vai ficar internado para sempre...vão encontrar uma solução.
    A verdade é que já passei por algo idêntico, mas com a minha avó. Sou de um país onde as superstições ainda existem e disseram que ela andava possuída por um espirito...bem não acreditei quando disseram isso. Um dia fui a um centro espirita...o objectivo era ir para de certa forma "salvarem" a minha avó...fui...dois dias depois ela estava bem...comecei a pensar que era tudo fantasia da minha cabeça e tretas, mas não era ela deixou de ter aqueles comportamentos estranhos.
    Não estou a dizer que é o mesmo que está a acontecer com o teu irmão, só quero que tenhas ainda um bocadinho mais de fé...sei que é dificil, mas tenta...

    C.N

    ResponderEliminar
  2. Anónimo1.8.11

    http://youtu.be/QW0i1U4u0KE

    fá-lo acreditar nisso :D

    ResponderEliminar
  3. Caro(a) C.N

    Este texto, como muitos outros, não é verídico, pelo menos não em relação à minha pessoa. Na verdade, nem sequer tenho um irmão, só uma irmã! De facto nasceu inspirado numa música chamada Medication, que relata algo semelhante. De qualquer modo, obrigado pela atenção. Fico feliz pela sua avó e que tudo tenha corrido pelo melhor.

    Diogo Pintas

    ResponderEliminar
  4. Anónimo3.8.11

    :O interessante

    Então fico feliz por não estares nesta situação!

    Infelizmente a minha avó não está lá muito bem...diagnosticaram Alzheimer...enfim...vive.se

    :/

    C.N

    ResponderEliminar

Comentários