sexta-feira, 28 de março de 2014

Já não sei os passos da manhã

Já não sei os passos da manhã
As meias com que me beijava e aquecia.
A bruma desvanecia
Suavemente
E em mãos de lã
Me embalava
A mente.

E o silêncio é agora um estrondo
O sangue que me deambulava
Faz agora um mar redondo.
A paixão encontra-se nas pedras
Da calçada mudas...
Guitarras sem cordas
Gargalhadas sisudas.

Rasga-se a castidade que julgara já perdida
Comunga a carne minha com a terra
Há tanto de vida quando se vai a vida...!
Mas não há mais obra, afazer, lida,
Acaba a paz, não há mais guerra.

Não há nada
Mas eu vejo tudo, tudo!
A mãe, o menino, todos os primeiros
Tempos e tempos inteiros
E uma catapulta de madeira
Que me lança
Numa dança
Que pensei dançar
A noite inteira.

E eu vou
Sigo o passo morto
Já não torto
Porque sem corpo.
Há uma certa evolução
Na Esquina que se diz regressiva
Sou mais por nada ser
A antítese é agressiva
Tanto quanto o gelo quente
Que no meu não-eu
As garras suaves criva.

Negócio fechado, leva-me
Leve
A alma ferve, enternecida
Já não há casacos, já não há presídio
Livre-me o fim do livre ser
Já não quero mais nascer
Dêem-me o sopro pulsante
Do homicídio.

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